31 agosto 2014

sul


quanto mais tarda rumar a sul e deixar-me lá ficar, quase esquecendo o caminho de volta, mais me pergunto se o que me faz adiar justifica tanta perda: o calor que se vai, os dias que voltam a ficar pequenos, o resto do mundo que regressa e vem cheio de pressa para respostas e decisões. repito-me como quem repete um mantra para se educar "res firma mitttescere nescit." por isto, tenho adiado evadir-me daqui. saberá melhor, que o que se alcança depois de tanta entrega e tanta luta sem desistir sempre nos deixa com outro sorriso, outro alívio. mas ainda assim me pergunto o que farei com os dias para sempre perdidos. ficam-me músicas assim, que me falam da gratidão aos que nos mostraram tudo o que podíamos ser, todos os sítios onde podíamos chegar, se nos propusessemos seriamente a tanto. algumas dessas pessoas ainda cá estão, outras só as trago por dentro, são uma multidão que ressoa em cada passo que dou ou que nego.a pé, ou de carro, evado-me mas levo-me sempre comigo, séneca tem razão tantas civilizações depois.o relógio do aparador tem corda e marca-me compasso ao coração.há um livro aberto sobre as estruturas da água que evoca a cena final do livro "andam faunos pelos bosques." os livros desabam da mesa para o chão. as persianas estão descidas mas as portadas corridas trazem o ruído da rua cá para dentro e levam lá para a fora a sombra de uma mulher que escreve, escreve, lê, pára para pensar e regressa. uma garrafa de tinto escolhido a dedo aguarda, ao lado de uma terrina ainda vazia, as notícias da próxima breve comemoração. todos os pequenos feitos devem merecer uma garrafa com os que cá estão, brindando a todos, sob pena de se levarem os dias sem a alegria mínima que nos arranca o nosso mais bonito sorriso.
https://www.youtube.com/watch?v=icd1c3FpnC4&index=3&list=RDV7nW2xywlHQ

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