24 novembro 2004

mãos a arder

fui ao cinema ver que filmes estavam em cartaz,já passava a hora da última sessão.trazia atravessado na garganta o adiamento da peça de teatro que não fora ver a lisboa naquele fim-de-semana.tinha a suspeita que traria dentro as respostas às perguntas que me recusava fazer.foi então que vi a peça anunciada num cartaz de tamanho A3, afixado num contentor de obras perto do mercado do bom sucesso.

no dia seguinte, acordei mais cedo que o costume, telefonei a demandar por bilhetes e pelo caminho para lá chegar. trabalhei a correr, fiz fintas no trânsito, verónicas, diria o outro senhor de olhos azuis, e cheguei a tempo, também mais cedo que o costume.

a sala estava cheia como um ovo e contei ainda algumas pessoas sentadas no chão. a voz, umas vezes quase gritada, outras a parecer soar-me sussurada no ouvido, pousada no meu ombro direito, dizia cada linha do texto como se trouxesse consigo o que estava antes e depois de si, como se cada linha fosse o traço de síntese entre dois planos.

a plateia esperou uns segundos antes de rebentar num aplauso, espera necessária para recuperar o fôlego? aplaudia de pé e os actores, com narizes vermelhos de palhaço, dançavam ao som da marcha.só quando a música se calou se sentiu a dimensão da ovação, que ribombava contra as paredes.sorri-me, o recado sempre vinha ali dentro.

às cinco da manhã, ainda tinha as mãos a arder.

“palhaço de mim mesmo”, com ruy de carvalho, fórum cultural de ermesinde.


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